sexta-feira, 23 de maio de 2008

Ledo Engano


Há pessoas que parecem fadadas ao sucesso, marcadas na testa pela boa sorte. Tem-se a certeza que basta que elas ajudem um pouquinho prá que tudo aconteça, da melhor forma. A loura era assim. Durante toda a vida, ela se destacou. Criança, assemelhava-se a criatura celeste. Púbere, já inspirava pensamentos bem menos puros. Alta e bem feita de corpo, tinha o sorriso largo e as maçãs naturalmente rosadas. Dona de ar infantil e zombeteiro, ostentava sedutora vivacidade. Combinação adorável de charme e presença de espírito. Ao observador desatento parecia desprotegida e, portanto, presa fácil. Ledo engano. A expansividade encobria a natureza reservada. Colecionava marcos significativos e inusitados: nunca tivera um namorado em toda a vida, e mais ainda, passara incólume pelo meio universitário, imune a todas as tentações sórdidas e saudáveis, comuns ao ambiente. Longe de ser inocente, ela empregava a malícia em despachar o pretendente tão logo o houvesse provado. Assim, eles se sucediam rapidamente, frustrados e perplexos. Não importava o desempenho, eles sempre eram descartados, agradando ou não. A romaria dos preteridos denotava um padrão: a loura escolhia entre os de tenra idade. Colecionava garotos, e quanto mais inofensivos, melhor. Nunca se havia aventurado além deles, não sabia o que um homem poderia oferecer. Não sabia o que era enlouquecer de tesão, nem conhecia a sensação de amar até a dor física. Ouvia os relatos das amigas e sentia que perdia algo, mas não se daria ao luxo de se deixar ser seduzida. O mundo como conhecia ruiria caso se apaixonasse. Estremecia só em pensar em perder o controle, em depender do movimento do oponente. “E se fosse o cara errado?” A dúvida a paralisava. E paralisou até que a vitalidade e o viço se extinguissem e não houvesse mais escolhas. Nem a mais radiante linha do destino pôde com o medo de viver.

Lívia Santana.
Uberlândia - 05/2005
Imagem: Céu Guitart.

Nenhum comentário:

 
BlogBlogs.Com.Br